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Queridos irmãos e irmãs!

Prossigamos a reflexão sobre as obras de misericórdia corporais, que o Senhor Jesus nos confiou a fim de que a nossa fé se mantenha sempre viva e dinâmica. De fato, essas obras tornam evidente que os cristãos não estão cansados nem são preguiçosos na expectativa do encontro final com o Senhor, mas que todos os dias vão ter com Ele, reconhecendo o seu rosto naquele de tantas pessoas que pedem ajuda. Hoje meditemos sobre esta palavra de Jesus: “Era estrangeiro e acolhestes-me; estava nu e vestistes-me” (Mt 25,35-36). No nosso tempo, é atual, como nunca, a obra relativa aos estrangeiros. A crise econômica, os conflitos armados e as mudanças climáticas impelem muitas pessoas a emigrar. Contudo, as migrações não são um fenômeno novo, mas pertencem à história da humanidade. Consiste em falta de memória histórica pensar que elas sejam próprias apenas da nossa época.

A Bíblia oferece-nos muitos exemplos concretos de migração. É suficiente pensar em Abraão. A chamada de Deus impeliu-o a deixar o seu país e ir para outro: “Deixa a tua terra, a tua família e a casa de teu pai e vai para a terra que eu te mostrar” (Gn 12,1). E assim aconteceu também para o povo de Israel, que do Egito, onde era escravo, caminhou durante quarenta dias no deserto até alcançar a terra prometida por Deus. A própria Sagrada Família – Maria, José e o menino Jesus – foi obrigada a emigrar para fugir das ameaças de Herodes: “José levantou-se durante a noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito. Ali permaneceu até a morte de Herodes” (Mt 2,14-15). A história da humanidade é feita de migrações: em cada latitude não há povo que não tenha conhecido o fenômeno migratório.

A propósito, durante os séculos assistimos a grandes expressões de solidariedade, embora não tenham faltado também tensões sociais. Hoje, o contexto de crise econômica infelizmente favorece o emergir de comportamentos de fechamento e não acolhimento. Em algumas partes do mundo erguem-se muros e barreiras. Às vezes parece que a obra silenciosa de muitos homens e mulheres que, de várias maneiras, se prodigalizam para ajudar e assistir os refugiados e os migrantes, seja obscurecida pelo rumor de outros que dão voz a um egoísmo instintivo. Contudo o fechamento não é uma solução, pelo contrário, acaba por favorecer os tráficos criminosos. A única solução é a solidariedade. Solidariedade com o migrante, solidariedade com o estrangeiro...

Compromisso com os migrantes

Hoje o compromisso dos cristãos nesse âmbito é urgente assim como era no passado. Observando só o século passado, recordamos a admirável figura de Santa Francisca Cabrini, que dedicou a sua vida juntamente com as suas companheiras aos migrantes rumo aos Estados Unidos da América. Também hoje precisamos desses testemunhos a fim de que a misericórdia possa alcançar muitos necessitados. É um compromisso que envolve todos, sem exclusão. As dioceses, as paróquias, os institutos de vida consagrada, as associações e os movimentos, assim como cada cristão, todos são chamados a acolher os irmãos e as irmãs que fogem da guerra, da fome, da violência e das condições de vida desumanas. Todos juntos somos uma grande força de apoio para quantos perderam pátria, família, trabalho e dignidade. Há alguns dias aconteceu uma pequena história urbana. Havia um refugiado à procura de uma rua e uma senhora aproximando-se dele, disse-lhe: “O senhor está a procurar algo?”. O refugiado, que estava descalço, respondeu: “Gostaria de ir à praça de São Pedro para atravessar a Porta Santa”. E a senhora pensou: “Mas sem sapatos como fará para caminhar?”. E chamou um táxi. Mas o migrante, aquele refugiado cheirava mal e o motorista do táxi quase não o deixava entrar, mas no final aceitou levá-lo. E a senhora, ao lado dele, durante o percurso perguntou-lhe sobre a sua história de refugiado e de migrante: dez minutos para chegar à praça. O homem narrou a sua história de dor, de guerra, de fome e a razão pela qual fugiu da sua pátria para migrar para aqui. Quando chegaram, a senhora abriu a bolsa para pagar o táxi e o taxista, que no início não queria que o migrante entrasse porque cheirava mal, disse à senhora: “Não, senhora, sou eu que devo pagar-lhe porque me fez ouvir uma história que mudou o meu coração”. Essa senhora sabia o que significa a dor de um migrante porque tem sangue armênio e conhece o sofrimento do seu povo. Quando fazemos algo desse tipo, no início não aceitamos porque nos incomoda um pouco, “... o mau cheiro...”. Mas no final, a história perfuma-nos a alma e faz-nos mudar. Pensai nessa história e pensemos no que podemos fazer pelos refugiados.

Outro aspecto é vestir quem está nu: o que significa senão restituir dignidade a quem a perdeu? Certamente, dando roupas a quem não as tem; mas pensemos também nas mulheres vítimas do tráfico obrigadas a estar pelas ruas, ou noutras pessoas, são demasiados os modos de usar o corpo humano como mercadoria, até dos menores. E também não ter um trabalho, uma casa, um salário justo é uma forma de nudez, ou ser discriminados pela raça, pela fé, são todas formas de “nudez”, diante das quais como cristãos somos chamados a estar atentos, vigilantes e prontos a agir.

Queridos irmãos e irmãs, não caiamos na armadilha de nos fecharmos em nós mesmos, indiferentes às necessidades dos irmãos e preocupados só com os nossos interesses. É precisamente na medida em que nos abrimos aos outros que a vida se torna fecunda, as sociedades restabelecem a paz e as pessoas recuperam a sua plena dignidade. E não vos esqueçais daquela senhora, do migrante que cheirava mal, nem do taxista ao qual o migrante mudou a alma.

Audiência Geral do papa Francisco. Praça São Pedro, 26 de outubro de 2016

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Quarta, 04 Janeiro 2017 10:35

A esperança também floresce em meio à dor

 

Prezados irmãos e irmãs!

Na catequese de hoje, gostaria de contemplar convosco uma figura de mulher que nos fala da esperança vivida no pranto. A esperança vivida no pranto! Trata-se de Raquel, esposa de Jacó e mãe de José e de Benjamin, aquela que, como nos descreve o Livro do Gênesis, morre ao dar à luz o seu segundo filho, ou seja, Benjamin.

O profeta Jeremias refere-se à Raquel, dirigindo-se aos israelitas no exílio para os consolar com palavras cheias de comoção e de poesia; ou seja, toma o pranto de Raquel, mas dá esperança:

Eis o que diz o Senhor: “Ouve-se em Ramá uma voz / lamentações e amargos soluços. / É Raquel que chora os filhos, / recusando ser consolada / porque já não existem” (Jr 31,15).

Nesses versículos, Jeremias apresenta essa mulher do seu povo, a grande matriarca da sua tribo, numa realidade de dor e pranto, mas, ao mesmo tempo, com uma perspectiva de vida impensada. Raquel, que na narração do Gênesis morrera dando à luz e assumira aquela morte para que o filho pudesse viver, é agora representada pelo profeta estando viva em Ramá, lá onde se reuniam os deportados, e chora os filhos que num certo sentido faleceram a caminho do exílio; filhos que, como ela mesma diz, “já não existem”, pois desapareceram para sempre.

E por isso Raquel não quer ser consolada. Essa sua rejeição exprime a profundidade da sua dor e a amargura do seu pranto. Diante da tragédia da perda dos filhos, uma mãe não pode aceitar palavras ou gestos de consolação, que são sempre inadequados, nunca capazes de aliviar a dor de uma ferida que não pode nem quer ser cicatrizada. Uma dor proporcional ao amor.

Qualquer mãe sabe tudo isso; e são tantas, ainda hoje, as mães que choram, que não se resignam à perda de um filho, inconsoláveis diante de uma morte impossível de aceitar. Raquel encerra em si mesma a dor de todas as mães do mundo, de todos os tempos, e as lágrimas de cada ser humano que chora perdas irreparáveis.

Essa rejeição de Raquel que não quer ser consolada ensina-nos também quanta delicadeza nos é pedida face à dor de outrem. Para falar de esperança a quem está desesperado, é necessário compartilhar o seu desespero; para enxugar uma lágrima do rosto de quem sofre, é preciso unir ao seu o nosso pranto. Somente assim as nossas palavras podem ser realmente capazes de dar um pouco de esperança. E se não posso proferir palavras assim, com o pranto, com a dor, é melhor o silêncio, a carícia, o gesto, sem palavras.

Lágrimas, sementes de esperança

E Deus, com a sua delicadeza e o seu amor, responde ao pranto de Raquel com palavras autênticas, não fingidas. Com efeito, assim prossegue o texto de Jeremias:

“Eis o que diz o Senhor, respondendo àquele pranto: Cessa de gemer, / enxuga as tuas lágrimas! / As tuas penas receberão a recompensa / – oráculo do Senhor. / Voltarão (os teus filhos) da terra inimiga. / Desponta no teu futuro a esperança / – oráculo do Senhor. / Os teus filhos voltarão para a sua terra” (Jr 31,16-17).

Precisamente devido ao pranto da mãe, ainda há esperança para os filhos, que voltarão a viver. Essa mulher, que tinha aceitado morrer no momento do parto para que o filho pudesse viver, com o seu pranto é agora princípio de vida nova para os filhos exilados, prisioneiros, desterrados. À dor e ao pranto amargo de Raquel, o Senhor responde com uma promessa que agora pode ser para ela motivo de verdadeira consolação: o povo poderá regressar do exílio e viver a sua relação com Deus na fé, livre. As lágrimas geraram esperança. E isso não é fácil de entender, mas é verdade. Muitas vezes, na nossa vida, as lágrimas semeiam esperança, são sementes de esperança.

Como sabemos, esse texto de Jeremias é retomado depois pelo evangelista Mateus e aplicado ao massacre dos inocentes (cf. 2,16-18). Um texto que nos põe diante da tragédia do assassinato de seres humanos indefesos, do horror do poder que despreza e suprime a vida. As crianças de Belém morreram por causa de Jesus. E Ele, por sua vez, Cordeiro inocente, viria a morrer por todos nós. O Filho de Deus entrou na dor dos homens. Não podemos esquecer isso. Quando alguém vem conversar comigo e me dirige perguntas difíceis, como, por exemplo: “Diga-me, padre, porque as crianças sofrem?”, realmente eu não sei o que responder. E digo apenas: “Olha para o Crucificado: Deus ofereceu-nos o seu Filho. Ele sofreu e talvez ali encontres uma resposta”. Mas não existem respostas aqui [mostra a sua cabeça]. Somente olhando para o amor de Deus que dá o seu Filho, que oferece a sua vida por nós, poderá indicar algum caminho de consolação. E por isso dizemos que o Filho de Deus entrou na dor dos homens; compartilhou e aceitou a morte; a sua Palavra é definitivamente verbo de consolação, porque nasce do pranto.

E na cruz será Ele, Filho agonizante, quem dará uma renovada fecundidade à sua Mãe, confiando-lhe o discípulo João e tornando-a Mãe do povo dos fiéis. A morte é derrotada, cumprindo-se assim a profecia feita por Jeremias. Também as lágrimas de Maria, como as de Raquel, geraram esperança e vida nova. Obrigado!

Audiência Geral. Praça São Pedro, 4 de janeiro de 2017

 

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Amados irmãos e irmãs!

O trecho do evangelho de João que ouvimos (cf. 4, 6-15) narra o encontro de Jesus com uma mulher samaritana. O que surpreende desse encontro é o diálogo muito conciso entre a mulher e Jesus. Isso permite-nos frisar hoje um aspeto muito importante da misericórdia, que é precisamente o diálogo.

O diálogo permite que as pessoas se conheçam e compreendam as exigências uns dos outros. Antes de tudo, ele é um sinal de grande respeito, porque coloca as pessoas numa atitude de escuta e na condição de compreender os aspetos melhores do interlocutor. Em segundo lugar, o diálogo é expressão de caridade, porque, mesmo sem ignorar as diferenças, pode ajudar a procurar e a partilhar o bem comum. Além disso, o diálogo convida-nos a pormo-nos diante do outro vendo-o como um dom de Deus, que nos interpela e nos pede para ser reconhecido.

Muitas vezes nós não nos encontramos com os irmãos, mesmo vivendo ao lado deles, sobretudo quando fazemos prevalecer a nossa posição sobre a do outro. Não dialogamos quando não ouvimos o suficiente ou quando tendemos a interromper o outro para demonstrar que temos razão. Mas quantas vezes, quantas vezes estamos a ouvir uma pessoa e impedimos que continue a falar dizendo: “Não, não! Não é assim!” e não deixamos que a pessoa acabe de explicar o que pretende dizer. E isso impede o diálogo: esta é agressão. O verdadeiro diálogo, ao contrário, necessita de momentos de silêncio, nos quais captar o dom extraordinário da presença de Deus no irmão.

Queridos irmãos e irmãs, dialogar ajuda as pessoas a humanizar as relações e a superar as incompreensões. Há tanta necessidade de diálogo nas nossas famílias, e como se resolveriam mais facilmente as questões se aprendêssemos a ouvirmo-nos reciprocamente! É assim no relacionamento entre marido e esposa, e entre pais e filhos.

Promoção da cultura do encontro

Quanta ajuda pode vir também do diálogo entre os professores e os seus alunos; ou entre dirigentes e trabalhadores, para descobrir as exigências melhores do trabalho.

Também a Igreja vive de diálogo com os homens e as mulheres de todos os tempos, para compreender as necessidades que estão no coração de cada pessoa e para contribuir para a realização do bem comum. Pensemos no grande dom da criação e na responsabilidade que todos temos de salvaguardar a nossa casa comum: o diálogo sobre um tema tão central é uma exigência iniludível. Pensemos no diálogo entre as religiões, para descobrir a verdade profunda da sua missão no meio dos homens, a fim de contribuir para a construção da paz e de uma rede de respeito e de fraternidade (cf. Enc. Laudato si’, 201).

Para concluir, todas as formas de diálogo são expressão da grande exigência de amor de Deus, que vai ao encontro de todos e lança em cada um a semente da sua bondade, para que possa colaborar na sua obra criadora. O diálogo derruba os muros das divisões e das incompreensões; cria pontes de comunicação e não permite que alguém se isole, fechando-se no seu pequeno mundo. Não vos esqueçais: dialogar significa ouvir o que me diz o outro e dizer com mansidão aquilo que penso. Se as coisas correrem assim, a família, o bairro, o lugar de trabalho serão melhores. Mas se eu não deixo que o outro diga tudo o que tem no coração e começo a gritar — hoje grita-se muito — esta relação não terá bom êxito; o relacionamento entre marido e esposa, entre pais e filhos não terá bom êxito. Ouvir, explicar, com mansidão, não agredir o outro, não gritar, mas ter um coração aberto.

Jesus sabia bem o que a samaritana, uma grande pecadora, tinha no coração; não obstante, não lhe negou a possibilidade de se expressar, deixou que falasse até ao fim, e entrou pouco a pouco no mistério da sua vida. Este ensinamento é válido também para nós. Através do diálogo, podemos fazer crescer os sinais da misericórdia de Deus e fazer deles instrumento de acolhimento e de respeito.

Audiência Jubilar do papa Francisco. Praça São Pedro, 22 de outubro de 2016

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Quarta, 25 Mai 2016 15:56

Orar sempre, sem nunca se cansar

 

Caros irmãos e irmãs!

A parábola evangélica que há pouco ouvimos (cf. Lc 18,1-8) contém um ensinamento importante: “A necessidade de orar sempre, sem nunca se cansar” (v. 1). Portanto, não se trata de rezar às vezes, quando tenho vontade. Não! Jesus diz que é preciso “orar sempre, sem se cansar”. E cita o exemplo da viúva e do juiz.

O juiz é uma personalidade poderosa, chamada a emitir sentenças com base na Lei de Moisés. Por isso, a tradição bíblica recomendava que os juízes fossem pessoas tementes a Deus, dignas de fé, imparciais e incorruptíveis (cf. Ex 18,21). Ao contrário, este juiz “não temia a Deus, nem respeitava pessoa alguma” (v. 2). Era um juiz iníquo, sem escrúpulos, que não tinha em consideração a Lei, mas fazia o que queria, segundo o próprio interesse. Uma viúva vai ter com ele para obter justiça. As viúvas, juntamente com os órfãos e com os estrangeiros, eram as categorias mais frágeis da sociedade. Os direitos que lhes eram assegurados pela Lei podiam ser espezinhados com facilidade porque, dado que eram pessoas sós e indefesas, dificilmente podiam fazer-se valer: uma pobre viúva, ali sozinha, ninguém a defendia, podiam ignorá-la, sem lhe fazer justiça. Do mesmo modo também o órfão, o estrangeiro, o migrante: naquela época esta problemática era muito acentuada. Diante da indiferença do juiz, a viúva recorre à sua única arma: continuar insistentemente a importuná-lo, apresentando-lhe o seu pedido de justiça. E é precisamente com essa perseverança que ela alcança a sua finalidade. Com efeito, numa certa altura o juiz atende-a, mas não porque é impelido pela misericórdia, nem porque a consciência lho impõe; ele simplesmente admite: “Dado que esta viúva me importuna, far-lhe-ei justiça, senão ela não cessará de me molestar” (v. 5). Desta parábola Jesus haure uma dupla conclusão: se a viúva conseguiu convencer o juiz desonesto com os seus pedidos insistentes, tanto mais Deus, que é Pai bom e justo, “fará justiça aos seus escolhidos, que clamam por Ele dia e noite”; e além disso, não os “fará esperar muito tempo”, mas agirá “imediatamente” (vv. 7-8).

Por isso Jesus exorta a rezar “sem se cansar”. Todos nós sentimos momentos de cansaço e de desânimo, sobretudo quando a nossa oração parece ineficaz. Mas Jesus tranquiliza-nos: diversamente do juiz desonesto, Deus atende os seus filhos de modo imediato, embora isto não signifique que o faça segundo os tempos e modos que nós gostaríamos. A oração não é uma varinha mágica! Ela ajuda a conservar a fé em Deus, a confiar em Deus até quando não compreendemos a sua vontade. Nisto, o próprio Jesus – que rezava muito! – serve-nos de exemplo.

A oração preserva a fé

A Carta aos Hebreus recorda que “nos dias da sua vida mortal, [Ele] dirigiu preces e súplicas, entre clamores e lágrimas, àquele que o podia salvar da morte, e foi atendido pela sua piedade” (5,7). À primeira vista esta afirmação parece improvável, porque Jesus morreu na cruz. E no entanto a Carta aos Hebreus não se engana: Deus salvou verdadeiramente Jesus da morte, vencendo-a com uma vitória completa, mas o caminho que teve de percorrer para a alcançar passou através da própria morte! A referência à súplica que Deus atendeu remete para a oração de Jesus no Getsêmani. Tomado pela angústia incumbente, Jesus reza ao Pai para que o livre do cálice amargo da paixão, mas a sua prece está permeada de confiança no Pai e Ele entrega-se incondicionalmente à sua vontade: “Contudo – diz Jesus – não se faça o que Eu quero, mas sim o que Tu queres” (Mt 26,39). O objeto da oração passa para segundo plano; o que importa antes de tudo é a relação com o Pai. Eis o que faz a oração: transforma o desejo, modelando-o segundo a vontade de Deus, qualquer que ela seja, porque quem ora aspira em primeiro lugar à união com Deus, que é Amor misericordioso.

A parábola conclui-se com uma pergunta: “Mas quando vier o Filho do Homem, acaso encontrará fé sobre a terra?” (v. 8). E com esta interrogação estamos todos alertados: não devemos desistir da oração, mesmo que não seja correspondida. É a prece que preserva a fé, pois sem ela a fé vacila! Peçamos ao Senhor uma fé que se faz oração incessante, perseverante, como a da viúva da parábola, uma fé que se alimenta do desejo da sua vinda. E na prece experimentamos a compaixão de Deus que, como um Pai, vem ao encontro dos seus filhos cheio de amor misericordioso.

Audiência Geral do papa Francisco. Praça São Pedro, 25 de maio de 2016.

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Amados irmãos e irmãs!

Na semana passada ouvimos a parábola do juiz e da viúva, sobre a necessidade de rezar com perseverança. Hoje, com outra parábola, Jesus quer ensinar-nos qual é a atitude certa para rezar e invocar a misericórdia do Pai; como devemos rezar; a atitude correta para orar. É a parábola do fariseu e do publicano (cf. Lc 18, 9-14).

Ambos os protagonistas vão ao templo para orar, mas agem de modos muitos diferentes, obtendo êxitos opostos. O fariseu reza “de pé” (v. 11) e usa muitas palavras. A sua é uma prece de ação de graças a Deus, mas na realidade é uma manifestação dos próprios méritos, com sentido de superioridade em relação aos “outros homens”, qualificados como “ladrões, injustos, adúlteros”, como, por exemplo — e indica aquele outro que estava ali — “o publicano” (v. 11). Mas este é o problema: o fariseu reza a Deus, mas na verdade olha para si mesmo. Ora por si mesmo! Em vez de ter diante dos olhos o Senhor, tem um espelho. Não obstante esteja no templo, não sente a necessidade de se prostrar diante da majestade de Deus; está de pé, sente-se seguro, como se fosse o dono do templo! E enumera as boas obras realizadas: é irrepreensível, observa a Lei mais do que lhe é devido, jejua “duas vezes por semana” e paga o “dízimo” de tudo o que possui. Em síntese, mais do que rezar, o fariseu deleita-se com a sua observância dos preceitos. E, no entanto, a sua atitude e as suas palavras estão longe do modo de agir e de falar de Deus, que ama todos os homens, sem desprezar os pecadores. Ao contrário, o fariseu despreza os pecadores, inclusive quando indica o outro ali presente. Em suma, o fariseu que se sente justo descuida o mandamento mais importante: o amor a Deus e ao próximo.

Portanto, não é suficiente perguntar-nos quanto oramos, mas devemos interrogar-nos também como rezamos, melhor, como é o nosso coração: é importante examiná-lo para avaliar os pensamentos, os sentimentos, e extirpar a arrogância e a hipocrisia. Mas eu pergunto: é possível rezar com arrogância? Não! Com hipocrisia? Não! Só devemos orar pondo-nos diante de Deus tais como somos. Não como o fariseu, que rezava com arrogância e hipocrisia. Vivemos todos arrebatados pelo delírio do ritmo diário, muitas vezes à mercê de sensações, atordoados, confusos. É preciso aprender a encontrar o caminho do nosso coração, recuperar o valor da intimidade e do silêncio, pois é ali que Deus nos encontra e nos fala. Só a partir dali podemos por nossa vez encontrar os outros e falar com eles. O fariseu vai ao templo, sente-se seguro de si mesmo, mas não se dá conta de ter perdido o caminho do seu coração.

Ao contrário, o publicano — o outro — vai ao templo com espírito humilde e arrependido: “Mantendo-se à distância, não ousava sequer levantar os olhos ao céu, mas batia no peito” (v. 13). A sua prece é muito breve, não longa como a do fariseu: “Ó Deus, tende piedade de mim, que sou pecador!”. Nada mais. Uma linda oração! Com efeito, os cobradores de impostos — chamados precisamente “publicanos” — eram considerados pessoas impuras, submetidas aos dominadores estrangeiros, eram desprezados pelo povo e em geral associados aos “pecadores”. A parábola ensina que a pessoa é justa ou pecadora não pela sua pertença social, mas pelo seu modo de se relacionar com Deus, pelo seu modo de se comportar com os irmãos. Os gestos de penitência e as poucas e simples palavras do publicano atestam a consciência acerca da sua condição miserável. A sua prece é essencial. Age com humildade, só está seguro de ser um pecador necessitado de piedade. Se o fariseu nada pedia porque já possuía tudo, o publicano só pode implorar a misericórdia de Deus. E isto é bonito: suplicar a misericórdia de Deus! Apresentando-se “de mãos vazias”, com o coração despojado e reconhecendo-se pecador, o publicano mostra a todos nós a condição necessária para receber o perdão do Senhor. No final é precisamente ele, tão desprezado, que se torna um ícone do autêntico crente.

Jesus conclui a parábola com uma sentença: “Digo-vos: ele — ou seja, o publicano — ao contrário do outro, voltou para casa justificado. Pois todo o que se exaltar será humilhado, e quem se humilhar será exaltado” (v. 14). Qual deles é o corrupto? O fariseu. Ele é precisamente o ícone do corrupto que faz de conta que reza, mas só consegue pavonear-se diante de um espelho. É um corrupto e finge que reza. Assim, na vida, quem se considera justo e julga o próximo desprezando-o é um corrupto, um hipócrita. A soberba compromete todas as boas ações, esvazia a oração, afasta de Deus e do próximo. Se Deus prefere a humildade não é para nos aviltar: a humildade é, sobretudo uma condição necessária para sermos elevados por Ele, de modo a experimentarmos a misericórdia que preenche os nossos vazios. Se a prece do soberbo não alcançar o Coração de Deus, a humildade do miserável abre-o de par em par. Deus tem uma fragilidade: a debilidade pelos humildes. Diante de um coração humilde, Deus abre totalmente o seu Coração. É esta humildade que a Virgem Maria exprime no cântico do Magnificat: “Olhou para a humildade da sua serva [...] A sua misericórdia estende-se, de geração em geração, sobre os que o temem” (Lc 1,48.50). Que Ela, nossa Mãe, nos ajude a rezar com um coração humilde. E nós repitamos três vezes esta linda prece: “Ó Deus, tende piedade de mim, que sou pecador!”.

Audiência Geral do papa Francisco. Praça São Pedro, 1º de junho de 2016

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Sábado, 18 Junho 2016 15:57

Conversão: caminho para a felicidade

 

Caros irmãos e irmãs!

Depois da sua Ressurreição, Jesus apareceu várias vezes aos discípulos, antes de se elevar à glória do Pai. O trecho do Evangelho que há pouco ouvimos (cf. Lc 24, 45-48) narra uma dessas aparições, na qual o Senhor indica o conteúdo fundamental da pregação que os apóstolos deverão transmitir ao mundo. Podemos resumi-la com estas duas palavras: “conversão” e “perdão dos pecados”. Trata-se de dois aspectos qualificadores da misericórdia de Deus que, com amor, cuida de nós. Hoje, tenhamos em consideração a conversão.

O que é a conversão? Ela está presente na Bíblia inteira, e de maneira particular na pregação dos profetas, que convidam continuamente o povo a “voltar para o Senhor”, pedindo-lhe perdão e mudando o seu estilo de vida. Em conformidade com os profetas, converter-se significa mudar de rumo e voltar de novo para o Senhor, baseando-se na certeza de que Ele nos ama, e que o seu amor é sempre fiel. Voltar para o Senhor!

Jesus fez da conversão a primeira palavra da sua pregação: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1, 15). É com este anúncio que Ele se apresenta ao povo, pedindo-lhe que aceite a sua palavra como a última e definitiva que o Pai dirige à humanidade (cf. Mc 12, 1-11). No que se refere à pregação dos profetas, Jesus insiste ainda mais sobre a dimensão interior da conversão. Com efeito, nela está comprometida a pessoa inteira, coração e mente, para se tornar uma criatura nova, uma pessoa renovada. Quem transforma o coração renova-se.

Mudança de vida

Quando Jesus exorta à conversão não se arvora em juiz das pessoas, mas fá-lo a partir da proximidade, da partilha da condição humana e, por conseguinte, do caminho, da casa, da mesa... A misericórdia por aqueles que tinham necessidade de mudar de vida ocorria com a sua presença amável, para incluir cada um na sua história de salvação. Jesus persuadia as pessoas com a amabilidade, com o amor, e com esse seu comportamento Ele tocava profundamente o coração das pessoas, e elas sentiam-se atraídas pelo amor de Deus e impelidas a mudar de vida. Por exemplo, as conversões de Mateus (cf. Mt 9, 9-13) e de Zaqueu (cf. Lc 19, 1-10) tiveram lugar precisamente deste modo, porque eles sentiam que eram amados por Jesus e, através dele, pelo Pai. A verdadeira conversão verifica-se quando acolhemos o dom da graça; e um sinal claro da sua autenticidade é quando sentimos as necessidades dos irmãos e estamos dispostos a ir ao seu encontro.

Estimados irmãos e irmãs, quantas vezes também nós sentimos a exigência de uma mudança que transforme a nossa pessoa inteira! Quantas vezes dizemos: “Devo mudar, não posso continuar assim... Ao longo deste caminho, a minha vida não dará fruto, será uma existência inútil, e eu não serei feliz!”. Quantas vezes pensamos assim, quantas vezes... E Jesus, ao nosso lado, com a mão estendida diz-nos: “Vem, vem ter comigo. Sou eu que ajo: mudarei o teu coração, transformarei a tua vida, far-te-ei feliz!”. Mas nós acreditamos nisto ou não? Cremos ou não? O que pensais vós: acreditais nisto ou não? Menos aplausos e mais voz: credes ou não credes nisto? (O povo: “Sim!”). É assim! Jesus, que está ao nosso lado, convida-nos a mudar de vida. É Ele, mediante o Espírito Santo, que semeia em nós esta inquietação para mudarmos de vida e sermos um pouco melhores. Portanto, aceitemos este convite do Senhor, sem lhe opor resistências, porque somente se nos abrirmos à sua misericórdia encontraremos a verdadeira vida, a autêntica alegria. Nós só lhe devemos escancarar a porta, e Ele fará tudo o resto. Ele faz tudo; quanto a nós, compete-nos abrir de par em par o coração para que Ele possa curar-nos e fazer-nos progredir. Asseguro-vos que assim seremos mais felizes. Obrigado!

Audiência Jubilar do papa Francisco. Praça São Pedro, 18 de junho de 2016

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Amados irmãos e irmãs!

“Senhor, se quiseres, podes purificar-me!” (Lc 5,12): é o pedido que ouvimos um leproso dirigir a Jesus. Esse homem não pede somente para ser curado, mas para ser “purificado”, ou seja, sarado integralmente, no corpo e no coração. Com efeito, a lepra era considerada uma forma de maldição de Deus, de profunda impureza. O leproso devia permanecer distante de todos; não podia entrar no templo, nem participar no serviço divino. Longe de Deus, afastado dos homens. Essas pessoas levavam uma vida triste!

Apesar disso, aquele leproso não se resigna à enfermidade, nem sequer às disposições que faziam dele um excluído. Para alcançar Jesus, não teve medo de violar a lei e entrou na cidade – o que não podia fazer, dado que lhe era proibido – e quando o encontrou, “lançou-se com o rosto por terra, suplicando-lhe: Senhor, se quiseres, podes purificar-me!” (v. 12). Tudo o que faz e diz esse homem, considerado impuro, é a expressão da sua fé! Reconhece o poder de Jesus: está convicto de que Ele tem o poder de curá-lo, e que tudo depende da sua vontade. Esta fé foi a força que lhe permitiu violar todas as convenções e procurar ir ao encontro com Jesus; assim, ajoelhando-se diante dele, chama-o “Senhor”.
A súplica do leproso demonstra que quando nos apresentamos a Jesus não é necessário fazer longos discursos. São suficientes poucas palavras, contanto que sejam acompanhadas pela plena confiança no seu poder absoluto e na sua bondade. Efetivamente, confiar na vontade de Deus significa entregar-se à sua misericórdia infinita. Também eu vos contarei um segredo pessoal. À noite, antes de ir para a cama, recito esta breve oração: “Senhor, se quiseres, podes purificar-me!”. E rezo cinco vezes o “Pai-Nosso”, um para cada chaga de Jesus, porque Jesus nos purificou com as suas chagas. Mas se eu o faço, também vós o podeis fazer, em casa, dizendo: “Senhor, se quiseres, podes purificar-me!”; e, pensando nas chagas de Jesus, receitai um “Pai-Nosso” para cada uma delas. E Jesus ouve-nos sempre!

O cristão não exclui ninguém

Jesus sente-se profundamente comovido por este homem. O Evangelho de Marcos realça que “Jesus se compadeceu dele, estendeu-lhe a mão, tocou-o e lhe disse: “Eu quero, fica curado!” (1,41). O gesto de Jesus acompanha as suas palavras, tornando mais explícito o seu ensinamento. Contra as disposições da Lei de Moisés, que proibia a aproximação de um leproso (cf. Lv 13,45-46), Jesus estende a mão e chega a tocá-lo. Quantas vezes nós encontramos um pobre que vem ao nosso encontro! Podemos até ser generosos, podemos ter compaixão dele, mas geralmente não o tocamos. Oferecemos uma moeda a ele, lançamo-la, mas evitamos de tocar a sua mão. E esquecemos que se trata do corpo de Cristo! Jesus ensina-nos a não ter medo de tocar o pobre e o excluído, pois é Ele que está neles. Tocar o pobre pode purificar-nos da hipocrisia, tornando-nos inquietos diante da sua condição. Tocai os excluídos. Hoje acompanham-me aqui estes jovens. Muitos pensam que seria melhor que eles permanecessem na sua terra, mas ali sofriam muito. São os nossos refugiados, mas por tantos são considerados excluídos. Por favor, eles são nossos irmãos! O cristão não exclui ninguém, deixa um lugar para todos, permite que todos venham!

Depois de ter curado o leproso, Jesus pediu-lhe que não falasse sobre isto com ninguém, e, contudo, disse-lhe: “Vai, mostra-te ao sacerdote e oferece pela tua purificação o que Moisés prescreveu, para lhes servir de testemunho” (v. 14). Essa disposição de Jesus indica pelo menos três aspetos. O primeiro: a graça que age em nós não busca o sensacionalismo. Em geral, ela move-se com discrição, sem clamores. Para curar as feridas e para nos guiar pelo caminho da santidade, ela trabalha modelando pacientemente o nosso coração segundo o Coração do Senhor, de maneira a assumir cada vez mais os seus pensamentos e sentimentos. O segundo: fazendo com que a cura ocorrida fosse averiguada oficialmente pelos sacerdotes e, oferecendo um sacrifício de expiação, o leproso volta a ser admitido no seio da comunidade dos fiéis e na vida social. A sua reintegração completa é a cura. Como ele mesmo tinha suplicado, agora está completamente purificado! Enfim, apresentando-se aos sacerdotes, o leproso presta-lhes testemunho acerca de Jesus e da sua autoridade messiânica. A força da compaixão com a qual Jesus curou o leproso levou a fé daquele homem a abrir-se à missão. Era um excluído e agora é um de nós.

Pensemos em nós, nas nossas misérias... Cada um tem as suas. Pensemos com sinceridade. Quantas vezes as encobrimos com a hipocrisia das “boas maneiras”. E precisamente agora é necessário que fiquemos sozinhos, que nos ajoelhemos diante de Deus e rezemos: “Senhor, se quiseres, podes purificar-me!”. Fazei-o, fazei-o antes de ir dormir, todas as noites. E agora recitemos juntos esta bonita oração: “Senhor, se quiseres, podes purificar-me!”.

Audiência Jubilar do papa Francisco. Praça São Pedro, 22 de junho de 2016

Publicado em Catequese do Papa

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