Quarta, 03 Fevereiro 2016 13:27

Deus é Pai, justo e misericordioso

 

Queridos irmãos e irmãs,

A Sagrada Escritura apresenta-nos Deus como misericórdia infinita, mas também como justiça perfeita. Como conciliar os dois aspectos? De que modo se articula a realidade da misericórdia com as exigências da justiça? Poderia parecer que são duas realidades que se contradizem; na verdade não é assim, porque é precisamente a misericórdia de Deus que leva ao cumprimento da justiça autêntica. Mas de que justiça se trata?

Se pensarmos na administração legal da justiça, vemos que quem se considera vítima de um abuso, dirige-se ao juiz no tribunal e pede que seja feita justiça. Trata-se de uma justiça retributiva, que inflige uma pena ao culpado, segundo o princípio que a cada um deve ser dado o que lhe é devido. Como recita o livro dos Provérbios: “Quem pratica a justiça está destinado à vida, mas quem persegue o mal está destinado à morte” (cf. 11, 19). Também Jesus fala sobre isso na parábola da viúva que repetidamente ia ter com o juiz e lhe pedia: “Faz-me justiça contra o meu adversário” (cf. Lc 18, 3).

Contudo, esse caminho não leva à verdadeira justiça porque na realidade não vence o mal, simplesmente limita-o. Mas é só respondendo com o bem que o mal pode ser deveras vencido.

Deus abre-se ao perdão para a salvação de todos

Eis então outro modo de fazer justiça que a Bíblia nos apresenta como via mestra a percorrer. Trata-se de um procedimento que evita o recurso ao tribunal e prevê que a vítima se dirija diretamente ao culpado para o exortar à conversão, ajudando-o a compreender que está a praticar o mal, fazendo apelo à sua consciência. Deste modo, finalmente vendo e reconhecendo o próprio erro, ele pode abrir-se ao perdão que a parte lesada lhe está a oferecer. E isso é bom: depois da persuasão do que é o mal, o coração abre-se ao perdão que lhe é oferecido. Esse é o modo de resolver os contrastes nas famílias, nas relações entre esposos ou entre pais e filhos, onde o ofendido ama o culpado e deseja salvar a relação que o une ao outro. Não se interrompa a relação, aquele relacionamento.

Certamente, é um caminho difícil. Requer que quem recebeu a ofensa esteja pronto a perdoar e deseje a salvação e o bem de quem o ofendeu. Mas só assim a justiça pode triunfar, porque se o culpado reconhecer o mal praticado e deixar de o fazer, eis que o mal já não existe, e aquele que era injusto torna-se justo, porque foi perdoado e ajudado a reencontrar a via do bem. E isso tem a ver precisamente com o perdão, com a misericórdia.

É assim que Deus age em relação a nós, pecadores. O Senhor oferece-nos continuamente o seu perdão e ajuda-nos a acolhê-lo e a tomar consciência do nosso mal para nos podermos libertar dele. Porque Deus não quer a nossa condenação, mas a nossa salvação. Deus não deseja a condenação de ninguém! Algum de vós poderia perguntar-me: “Mas Padre, Pilatos merecia a condenação? Deus queria isso?” — Não! Deus queria salvar Pilatos e também Judas, todos! O Senhor da misericórdia queria salvar todos! O problema é deixar que Ele entre no coração. Todas as palavras dos profetas são um apelo apaixonado e cheio de amor que procura a nossa conversão. Eis o que o Senhor diz através do profeta Ezequiel: “Porventura comprazer-me-ei com a morte do pecador [...] ou com a sua conversão, de maneira que ele tenha vida?” (cf. 18, 23; e 33, 11), é isso que agrada a Deus!

Este é o coração de Deus, um coração de Pai que ama e deseja que os seus filhos vivam no bem e na justiça e portanto vivam em plenitude e sejam felizes. Um coração de Pai que vai além do nosso pequeno conceito de justiça para nos abrir aos horizontes infinitos da misericórdia. Um coração de Pai que não nos trata segundo os nossos pecados e não nos repreende, nem conserva a sua ira, como diz o Salmo (cf. 103, 9-10).

É precisamente um coração de pai que queremos encontrar quando vamos ao confessionário. Talvez nos diga algo para nos ajudar a entender melhor o mal, mas ao confessionário vamos todos para encontrar um pai que nos ajude a mudar de vida; um pai que nos dê a força para continuar; um pai que nos perdoe em nome de Deus. E por isso ser confessor é uma responsabilidade tão grande, porque o filho, a filha que vai ter contigo e espera encontrar um pai. E tu, sacerdote, que estás ali no confessionário, estás no lugar do Pai que faz justiça com a sua misericórdia.

Audiência Geral do papa Francisco. Praça São Pedro, 3 de fevereiro de 2016

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