Quinta, 01 Junho 2017 18:54

Pentecostes

Com a solenidade de Pentecostes se conclui o Ciclo Pascal, o tempo litúrgico mais denso e importante de todo a ano litúrgico. O mistério da Páscoa encontra seu ápice no envio do Espírito, o “outro Consolador” que acompanha a vida da Igreja e atualiza o que Jesus disse e fez, levando tudo ao pleno cumprimento.

O envio do Espírito se dá 50 dias depois da ressurreição, daí o nome de Pentecostes.
Gostaria de realçar alguns pontos significativos e importantes para a nossa vida espiritual e eclesial.

1. Os nomes dados ao Espírito são diferentes, mas convergem na mesma direção: é o Consolador, o Advogado, o Paráclito, o Espírito Santo. Sua missão é de defesa dos discípulos que terão muitas tribulações no mundo, encorajando, motivando, iluminando, criando perseverança, convicções, paresia. Quando pensamos nos advogados que não perdem tempo para encontrar nas leis uma brecha para defender seus assistidos, torna-se ainda mais sugestivo e empolgante saber que Deus é por nós e, portanto, nada e ninguém será contra nós. O Espírito defende e consola. Como não encaixar isso tudo nos grandes temas desenvolvidos nestes últimos tempos, como por exemplo, o da misericórdia? O Deus que quer que todos se salvem, é o Deus que tudo faz para que ninguém se perca. Isso encoraja e dá força para caminhar, apesar das dificuldades e contradições que nos acompanham diariamente.

2. O Espírito é o principal protagonista da missão. É Ele quem indica o que fazer, aonde ir ou não ir. Somos simplesmente intermediários entre o Espírito e a História. No livro dos Atos dos Apóstolos é muito evidente isso quando se diz “o Espírito nos proibiu” de ir naquele lugar e indica a Macedônia como praça de ação dos evangelizadores. O Espírito sendo o protagonista principal de tudo, pede que sejamos dependentes em tudo, das suas inspirações e indicações. Uma Igreja aberta aos impulsos do Hóspede interior que permanece sempre conosco, é uma Igreja que caminha, deixa rastos na história; que quer colocar o carro diante dos bois e “programar” o Espírito, somente fracassa, também quando encontra cristãos desprevenidos que lhe batem palmas e a exaltam.

3. O Espírito leva à plenitude da verdade. Deus em Jesus é delicado e respeitoso. Não queima etapas: “agora não estão nas condições de entender tudo, mas quando o Espírito vier, ele vos conduzirá à plenitude da verdade”. A pedagogia divina é maravilhosa, vai por etapas. Se tudo já foi dito por Jesus, nem tudo ainda foi entendido por nós. É tarefa do Espírito revelar e levar ao entendimento pleno do que Jesus já disse. Seria interessante aqui inserir o tema da Bíblia e da Tradição, das definições dogmáticas que se deram no decorrer na história, mas não é o caso. Permanece, portanto, a necessidade de uma docilidade integral ao Espírito que também por meio do Magistério da Igreja ajuda toda a comunidade a chegar à plenitude da verdade.

4. O Espírito é Aquele que torna cada discípulo capaz de testemunho, até de dar a vida pelo Mestre. “Sereis minhas testemunhas na Judeia, na Samaria... até os extremos confins da terra...” Isso acontece por obra e impulso do Espírito. A história da Igreja - de ontem e de hoje - é cheia de testemunhas destemidos e corajosos que não recuaram diante das ameaças e dificuldades que pelo nome de Jesus tiveram que enfrentar. O fraco, com a presença do Espírito Santo, se torna forte; o confuso se torna lúcido; o indeciso corajoso. Que urgência urgentíssima temos de viver o clima de Pentecostes hoje, para sair de uma letargia preocupante, da mediocridade espantosa, da visão de Igreja espetáculo, assumindo a lógica da Igreja fermento, sal e luz. Isso tudo é obra silenciosa, mas concreta do Espírito.

5. O dia de Pentecostes para cada um se torna concreto e personalizado no dia da Crisma, da Confirmação. Naquele dia se abrem as portas do cenáculo, onde estamos fechados por medo dos judeus, para assumir uma missão que não tem limites. Naquele dia a gente retoma a vontade de sonhar, de lutar, de enfrentar, em nome de Cristo, o projeto dele. É preciso retomar de forma mais séria a Pastoral da Crisma, para não reduzi-la, apesar das bonitas palavras que se usam, a uma festa de formatura e nada mais. O Espírito Santo é espírito de liberdade, de projetos, de amor, de sonhos, não é espírito de chatice, de mesmice, de rotina. Está na hora de acordar e dar novamente ao Espírito seu papel em nós. Está na hora de colocar na fogueira todas aquelas práticas que se instauraram durante a celebração do sacramento que nada tem a ver com aquilo que o Consolador quer realizar.

6. O Espírito é aquele que renova a face da terra! Que palavras abençoadas e urgentes, sobretudo na realidade sócio-política de hoje. Se nada se renova, aliás, se o mofo ou o estrago manifestam sua presença que envelhece tudo, significa que nós cristãos estamos brincando com Deus e seu Espírito, reduzindo tudo a ritos sem vida. A presença do espírito é invisível, mas se manifesta por meio dos frutos que produz. Se isso não acontece, algo não está certo.

Não é possível afirmar que tudo está indo bem em nossas comunidades se existe mentira, corrupção e bajulações descabidas. O Espírito quer fazer novas todas as coisas por meio de você, de mim, de todos nós.

Que possamos em Pentecostes perceber que “a cada um foi dada uma manifestação do Espírito para o bem comum” e colocar os nossos dons – que são sempre parciais e, portanto, precisamos do dom do outro – a serviço de todos para sermos uma Igreja viva, dinâmica, criativa, arriscada e ousada.

Dom Carmelo Scampa

Bispo diocesano de São Luís de Montes Belos-GO

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