“A Palavra se fez carne e habitou entre nós!”. A liturgia da Palavra na missa da meia-noite e na missa da aurora apresentou-nos Jesus Menino nascido em Belém de uma forma pobre e humilde. É verdadeiro Deus, mas vemos uma criança recém-nascida. É o nosso Salvador, mas revestido da nossa natureza humana. Na missa do dia, falam-nos o evangelista S. João e o autor da Carta aos Hebreus. Utilizando uma linguagem solene, os textos bíblicos apresentam-nos esta criança como a Palavra Eterna! O Filho de Deus entra na nossa vida temporal, mas Ele foi gerado antes de todos os tempos: “No princípio era a Palavra! A Palavra estava junto do Pai! Mas a Palavra era Deus!” Jesus é o Filho Unigênito do Pai. A Carta aos Hebreus também nos apresenta Jesus como o Filho de Deus: “Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei!”. Ele, a Palavra definitiva do Pai por quem tudo foi criado! Deus tinha falado através dos profetas. Agora fala-nos através de seu Filho! O Eterno Pai, “tudo sustenta com a sua Palavra!” “Ela é o esplendor da glória de Deus e a perfeita imagem do ser divino!” (Hb 1, 1-6). Hoje, em comunhão com toda a Igreja continuamos a proclamar a fé em Jesus Cristo, Verdadeiro Deus e verdadeiro Homem. Na recitação do Credo ajoelhamos quando dizemos: “Nasceu da Virgem Maria e se fez homem”. Verdadeiro Deus porque “o Verbo era Deus”; verdadeiro homem porque “a Palavra Se fez carne e habitou entre nós!” (Jo 1,1.14)
Natal é festa de alegria, festa de paz, festa de luz, porque o Menino que nasceu é o “Príncipe da Paz”, é a “Vida e a Luz dos homens”. No entanto, não podemos esquecer que “o povo vivia nas trevas!” O profeta Isaías afirma que nas trevas brilhou uma grande luz. S. João esclarece, dizendo que “a Palavra era a luz verdadeira que ilumina todo o homem”. Natal lembra-nos com tristeza que nem todos quiseram aceitar Jesus como seu Salvador. “O mundo foi feito por Ele”, mas em Belém não havia lugar para Ele nas hospedarias! “Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam!” E pior que isso: “Ele era Vida dos homens” e os homens quiseram dar-lhe a morte logo ao nascer: “José, toma o Menino e sua Mãe! Foge para o Egito, porque Herodes procura o Menino para o matar!” (Mt 2,13).
O nosso tempo não é melhor que o tempo em que Jesus nasceu, há cerca de dois mil anos. Se acreditamos que Jesus se identifica com os pequeninos, podemos reafirmar com os evangelistas que Jesus continua a não ter lugar... Talvez pior ainda! Jesus não tinha uma casa para nascer, mas tinha uma Mãe com os braços abertos para o receber. Hoje, quantas crianças abandonadas, rejeitadas, pelos seus próprios pais. Jesus teve que enfrentar a crueldade de Herodes, que mandou matar as crianças de Belém. Hoje, quantas crianças não chegam a nascer porque são mortas pela vontade de seus pais no seio materno! E isso não apenas numa pequena aldeia, mas à escala mundial! Jesus menino não tinha casa nem berço, hoje muitas vezes há casas e berços, mas não há crianças para enchê-las de alegria.
O poeta escreveu: “Natal é vida que nasce! Natal é Cristo que vem. Nós somos o seu presépio e a nossa casa é Belém”. Pergunto: de que nos serve celebrar o nascimento de Jesus hoje, se amanhã não defendemos o direito à vida das crianças? Direito à vida desde o seio materno. Natal não é apenas recordar o grande Presente que Deus nos enviou, é, sobretudo, ter a coragem de nós próprios sermos a Presença de Deus, tornar Deus presente para tantas pessoas que nunca recebem um gesto de amor. Amar é tornar Deus presente no meio de nós! Alguém escreveu: “É sempre Natal no coração que ama!” Façamos de toda a nossa vida um contínuo dia de Natal.
Dom Washington Cruz
Arcebispo de Goiânia