O mundo acompanhou, recentemente, o gesto do Santo Padre de celebrar a abertura da Porta Santa, dando início ao Ano Jubilar que tem como tema motivador a experiência da misericórdia. Naquela ocasião, o papa Francisco disse que “o Jubileu significa a grande porta da misericórdia de Deus, mas também as pequenas portas das nossas igrejas, abertas para permitir que o Senhor entre e sempre nos renove, mas abertas também para que possamos sair a anunciar a alegria do Evangelho” (Audiência Geral, 18 novembro 2015).
O Natal é o grande sinal da misericórdia de Deus para com seu povo. Jubileu é tempo de alegria. O Nascimento do Menino Deus foi anunciado com grande alegria nos céus, conforme narra o Evangelho de São Lucas. E a fonte da alegria está na presença e na proximidade de Deus que nos enviou seu filho unigênito, nascido da Virgem Mãe. É Ele a causa da nossa alegria. São Paulo não se contém na convocação jubilar: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. O Senhor está próximo” (Fl 4,4).
A grande alegria do Natal não reside no comércio ávido dos presentes tantas vezes sem sentido. A grande alegria do Natal também não se esgota à mesa das confraternizações e das festas tão comuns neste tempo e que tantas vezes entorpecem a visão e as mentes e não permitem enxergar a verdadeira razão da alegria do Natal. A alegria do Natal é tão simples, quanto profunda. Deus, rico em misericórdia, Ele próprio amor sem limites, vem ao encontro do gênero humano na figura simples de um menino em meio a uma cena marcadamente familiar e igualmente simples. Sem pompas, distante dos festins imperiais, em meio aos animais e junto dos pobres, é de lá que vem o grande sinal da misericórdia de Deus. A alegria cristã é uma alegria serena, tranquila, que acompanha sempre o cristão, porque brota da certeza de que Deus nos ama, de que somos importantes para Ele, de que estamos sempre em Suas mãos. Porque a misericórdia de Deus é fonte de alegria.
O clamor eloquente do Natal é evidente. A prática da misericórdia educa para a necessidade de estar atento às periferias geográficas e existenciais, aos limites onde o homem não mais encontra sentido, onde as forças humanas parecem esvair-se para, de lá, se perceber que o Deus-Menino restaura as esperanças, renova a coragem, dá novo alento ao seu povo. Na Encarnação no seio da Virgem Maria, o Filho de Deus resgata a humanidade, ofertando os marcadores mais significativos para uma vida verdadeiramente alegre e para uma sociedade autenticamente justa e fraterna.
O Natal traz uma relação estreita com o gesto do papa Francisco na abertura da Porta Santa. “Estou à porta e bato, se alguém ouvir a minha voz e me abrir a porta, entrarei na sua casa e cearemos, eu com ele e ele comigo” (Ap 3,20). Atravessar a Porta Santa e celebrar o Jubileu será este nosso abrir a porta a Deus que nos aguarda, a Deus que, na Encarnação de Jesus no seio de Maria, quer entrar na nossa vida, no nosso coração e dar-nos vida em abundância. Abrir as portas é deixar Deus entrar e iluminar a nossa mente, abrir os nossos corações aos outros; olhar com os olhos de Deus, rico em misericórdia, o mundo em que vivemos, e que construímos e sonhamos. Libertar o nosso coração de tudo o que seja egoísmo e maldade.
“Sede misericordiosos como o Pai é misericordioso” é o lema do Jubileu. Abre-se, assim, um tempo novo, um ano da graça para contemplar o mistério da misericórdia, que é fonte de alegria, serenidade e paz; uma oportunidade para fixarmos o nosso olhar no rosto de Cristo e nos tornarmos, nós próprios, sinal eficaz do agir do Pai (MV, 2-3). Tal como Cristo é misericordioso, assim somos chamados, também nós, a sermos misericordiosos uns para com os outros.
Nesta bela tradição do Natal reside uma nova oportunidade para que todos preparem os corações e seus ambientes mais próximos para receber Jesus Menino, saboreando e testemunhando cada um a alegria de ser cristão. A Virgem Santa Maria, Mãe da Misericórdia, acompanhe nesse itinerário.
E que o Natal reacenda a esperança do povo brasileiro, nestes momentos complexos do cenário nacional, a encontrar o caminho da misericórdia e da justiça, alicerces de um mundo novo no qual todas as divisões devem ser superadas. Cristo, na sua encarnação na história, reúne a humanidade dispersa, alinha os corações segundo o querer de Deus e restaura a esperança definitiva que ultrapassa todas as desesperanças. E realiza a verdadeira Justiça, uma das consequências concretas que o Ano Jubilar anuncia.
Feliz e Santo Natal a todos!
Dom Washington Cruz, CP
Arcebispo de Goiânia