Falta-nos o sentido do Natal

 

Menino Jesus,

Olho para seu presépio e meu coração de pastor é invadido por um misto de alegria e de preocupação. Seu semblante inocente e o esplendor da pureza do seu olhar me devolvem a certeza de que sua doce presença no mundo é a única e exclusiva garantia da esperança num futuro melhor para a humanidade inteira.

Olho para Maria, José, os pobres pastores de Belém e os magos que o circundam e vejo em cada um deles uma resposta particular e decidida de amor ao convite do Pai Eterno para acolherem a Salvação que você nos trouxe. Sinto a felicidade de crer que esse dom da sua Salvação nos tirou, definitivamente, do domínio das traições ao amor e nos recolocou no ambiente de acolhimento e de promoção da paz e da justiça. Ao renovar essa alegria, no entanto, me pego preocupado com a fraquíssima resposta que temos dado, em nossos dias, ao seu convite de amor.

Seu amor revolucionário e abrasador não tem encontrado no mundo, nas igrejas e no nosso coração, a acolhida adequada. Andamos distraídos com nossas aventuras científicas, econômicas, sociais e culturais. As conquistas que temos obtido nesses campos, sempre boas e necessárias, têm nos embriagado de tal modo que nos esquecemos de seu desconcertante nascimento em uma estrebaria de Belém. Embalados pelos avanços, caímos na tentação de planejar nossa sobrevivência sem considerar de forma substantiva o seu testemunho e a sua palavra. Experiência que nos tem levado a passar por grandes turbulências. Muitos dos nossos jovens se perdem na ilusão da droga, do tráfico e de outras violências. Os números das estatísticas da violência contra as mulheres continuam fazendo nossa face corar de vergonha. Muitos doentes, idosos, pessoas com deficiência permanecem sem o cuidado merecido. E o horror dos horrores: crianças, como você, são violentadas.

Fome, desolação, pestes infernais ainda colhem vidas de tantos irmãos e irmãs nossos em várias partes do mundo. Enquanto isso, políticos humilham seus povos com um desfile sem fim de benefícios pessoais e de grupos. E ganha milhões de adeptos, em toda parte, uma cultura do culto às futilidades da vida dos ricos e famosos. Até a festa do seu Natal está contaminada por essa perversa mistura. As lojas, os espaços públicos, as casas e, muitas vezes, até mesmo as igrejas não trazem os temas da simplicidade da sua chegada, mas o luxo que parece unir e salvar a todos em torno do glamour, dos presentes e das mesas fartas.

Falta-nos, Menino, maior consciência do que sua vinda nos deu, verdadeiramente, como presente. A doçura da sua presença na manjedoura está ornada pelo lenho da cruz na qual você se entregou por amor a todos nós. A luminosidade que emana dos rostos santos são a expressão da adesão deles e um convite atual para que nos entreguemos na execução do plano de amor do Pai que nos enviou você.

Olho para você e para o mundo e peço pelo meu povo. Peço a luz do Espírito Santo para o nosso discernimento. Peço saúde e confirmação do ministério do Santo Padre e dos bispos, meus irmãos. Peço entusiasmo e fidelidade para nossos padres, religiosos e leigos. Peço paz e sustento digno para nossas famílias. Peço clarividência e determinação para os governantes, coragem e bondade para os empresários. Peço luz e força para os jovens, esperança e cura para os doentes. Peço proteção e vigor para os adolescentes e as crianças, amparo e carinho para os idosos. Peço as bênçãos de que todos precisamos para honrar o seu nascimento com frutos de conversão.

Dom Washington Cruz

Arcebispo Metropolitano de Goiânia