Voltar às fontes é sempre um gesto importante na vida humana. Quando se perde ou se esquece do sentido do presente, é preciso retornar às origens para se compreender a razão que fundamenta as coisas. Assim também as festas religiosas. Revisitar as suas origens, o sentido de sua existência, a conexão existente com o passado quando as mesmas surgiram alimenta o presente de significado verdadeiro.
Revisitemos, pois, o sentido originário do Natal.
Tudo remonta à cena descrita por São Lucas em seu Evangelho. Único, dentre os quatro evangelistas, a traçar com riqueza de detalhes o cenário, os personagens e, mais do que isso, a mensagem salvífica que a Encarnação do Verbo Eterno anuncia preponderantemente. (cf. Lc, 1).
A origem remonta à linda cena, talvez a mais desenhada, pintada, esculpida, encenada pelos atores e autores das diversas culturas no mundo inteiro. Ali, em uma pequena aldeia pertencente à região de Nazaré, cidade de Belém (Casa do Pão), um choro de criança recém-nascida ecoa os ares da noite. Uma estrela paira sobre o local. Uma família inteira se debruça nos cuidados amorosos para com aquele que foi anunciado pelo Anjo à jovem Maria, meses antes. Uma família acolhe em seu interior o Verbo que se tornou carne, como mais tarde vai lecionar o evangelho teológico de São João. O milagre maior de toda a humanidade está ali concretizado: um filho nos foi dado. (cf. Lc 2, 11)
Chegando ao local, os pastores deram o melhor do que poderiam dar. Suas presenças atentas, seus olhares cheios de esperança, a longa caminhada que empreenderam para ali tão somente contemplar e reverenciar o menino depositado na pobreza da manjedoura, entre os animais do campo, “porque não havia lugar para eles na estalagem”. A simplicidade e a pobreza foi o caminho do primeiro e derradeiro e verdadeiro Natal. Nada de opulências, de excessos, de confusões de qualquer ordem.
Três séculos mais tarde, na história do Cristianismo do Oriente, registra-se a presença de um jovem chamado Nicolau. Talvez, sim, a história de São Nicolau, não a de um “papai noel”, devesse ser contada, e recontada e relembrada às crianças, jovens e adultos católicos. Um filho de cristãos abastados ajuda com o que pode a que um comerciante não entregue suas filhas à prostituição, ante a crise que se instalou em sua família e em seus negócios, já que o mesmo não possuía dote para que uma de suas filhas pudesse se casar. Conta a lenda que Nicolau passou em frente à casa do comerciante em apuros e jogou pela janela um saco contendo moedas de ouro e prata e assim o comerciante pôde realizar o casamento de sua filha primogênita. Narra-se que o mesmo aconteceu com as duas outras filhas do mesmo comerciante. A história de São Nicolau é longa e muito interessante. Mais tarde ele se torna bispo da Igreja e para o Cristianismo verdadeira inspiração para que se compreenda o sentido do Natal.
O gesto de celebrar com a presença de São Nicolau como fonte inspiradora do serviço e da caridade fraterna faz com que a noite do dia 24 de Dezembro e as celebrações do dia 25 ganhem um verdadeiro e amplo sentido. É preciso passarmos do “natal dos presentes e das festas” para o Natal da Celebração da verdadeira alegria da Caridade de Deus para com a humanidade inteira, dando-nos Seu próprio Filho para que todo aquele que nele crer não pereça, mas tenha a luz eterna.
Que a Luz do Santo Natal, a Luz que emana da manjedoura de Belém, a Luz que vem do Oriente, encha as noites das famílias de nossa Arquidiocese de beleza, de sentido, de doçura e de paz, tudo isso sinal da verdadeira festa e da alegria que nunca acaba.
Maria, Mãe de Deus, Estrela da Evangelização, interceda junto ao Seu Filho, gerado de seu ventre virginal, para que a humanidade encontre o caminho da paz que os anjos anunciaram nos céus, naquela noite primordial, aurora do mundo novo.
Dom Washington Cruz, CP
Arcebispo Metropolitano de Goiânia