Iniciação à Vida Cristã: caminho dos discípulos de Jesus Cristo

Logo após a última Reunião do Conselho Episcopal Regional (Conser), em 2017, realizada nos dias 21 a 23 de novembro, os bispos e os coordenadores de pastorais, movimentos e organismos, participaram de uma formação sobre o Documento 107 da CNBB, “Iniciação à vida cristã: itinerário para formar discípulos missionários”, com o bispo auxiliar de Porto Alegre (RS), Dom Leomar Antônio Brustolin. Em sua apresentação, ele fez um apanhado sobre os quatro capítulos do documento. Conforme suas colocações, a iniciação à vida cristã é uma dinâmica que visa introduzir a pessoa na fé cristã, isto é, um caminho cujo objetivo é formar discípulos de Jesus Cristo. “O percurso desse processo integra os discípulos à Igreja de Cristo, à comunidade de fé, para que testemunhem o Cristo no mundo”, destacou.

Confira a entrevista

O que é a Iniciação à Vida Cristã?
É uma dinâmica que visa introduzir a pessoa na fé cristã, isto é, se uma pessoa que nunca conheceu a nossa fé desejasse seguir a Jesus Cristo, quais seriam os passos a serem percorridos para que essa pessoa entrasse na família de Jesus que é a Igreja? E participasse da alegria de ser discípulo de Jesus? Por isso, a iniciação à vida cristã é uma dinâmica que visa formar discípulos de Jesus Cristo para integrarem a sua Igreja, a sua comunidade de fé e assim testemunharem Cristo no mundo.

Não é suficiente evangelizar apenas nas salas de catequese?
Durante muito tempo tivemos uma catequese mais ligada à instrução do que a iniciação. Nós instruíamos mais. Teve seu valor tudo isso. Instruir significa memorizar, decorar, mostrar aspectos mais teóricos e importantes da fé: conhecimentos. Mas é preciso também aprender a rezar, celebrar, conviver, testemunhar. Quando a gente educa uma pessoa para a fé, não basta ela saber. Tem que viver, transformar a vida em atitudes, comportamentos e escolhas. Portanto, a iniciação à vida cristã é diferente de uma instrução cristã. A catequese que a maioria de nós participou estava mais ligada à instrução, mas agora nós queremos propor que catequistas e comunidades permitam a experiência da iniciação a alguém em um caminho. A ideia de caminho, processo, tudo aquilo que revela mais dinâmicas do que eventos é o que nós queremos insistir.

Quais os principais desafios da catequese hoje?
O primeiro é constatar o desafio da transmissão da fé às novas gerações. As famílias, as paróquias, os catequistas. Todos nós sabemos que precisamos contar com novos meios de comunicação, novos meios e linguagens, porque nem a linguagem está sendo fácil assimilar hoje. Diante de uma cultura cada vez mais plural, não necessariamente uma cultura cristã, anunciar Jesus Cristo e aderir a Jesus é um desafio não impossível, mas que certamente vai exigir mais esforços.

A internet é um caminho para a iniciação à vida cristã?
Pode ser um caminho, mas depende do que é comunicado. Comunicamos às vezes muitos aspectos da religiosidade que não é o coração da fé. Precisamos focar no mistério pascal e a partir disso desdobrar a comunicação porque eu entendo os meios de comunicação como um carro. Ele está à disposição, mas sou eu quem vou dirigi-lo para onde eu quero. Então não basta dizer que entrando nas redes sociais digitais estará tudo resolvido. Depende do que eu vou comunicar. É indispensável a nossa presença nelas. Mas o que eu vou comunicar? Como eu vou comunicar? E mais uma coisa: não existe comunicação da fé sem testemunhos, sem exemplo, sem vivência, só com boas mensagens. Nós já estamos cansados de receber diariamente mensagens de bom dia, boa tarde, pelo whatsapp, pelo Facebook, e até pelo e-mail. Muitas palavras que são comunicadas nesses espaços não tem o peso do que é dito. Tem duplo sentido. Pode ser um sentido positivo ou um sentido vazio. A fé supõe testemunho, exemplo, vivência e conteúdo bem focado para comunicar bem o que nós queremos. O desafio está em ser denso de forma sucinta e é muito mais difícil comunicar profundamente com menos palavras do que escrever muito para justificar um pensamento mais robusto, por isso o nosso desafio da linguagem é este: como aproveitar os novos meios para comunicar a densidade da fé cristã. Para chegarmos a isso nós ainda temos um caminho a percorrer.

Por que a iniciação à vida cristã renova a vida comunitária?
Porque nós precisamos revitalizar todas as paróquias e comunidades com seguidores de Jesus Cristo e não apenas adeptos de práticas religiosas. Renova a comunidade porque ela precisa ser sal da terra e luz do mundo. Não pode ser apenas seguidora de elementos soltos. Ela tem que fazer uma síntese de vida. Tem que trazer a felicidade e compromisso para as pessoas, tem que abraçar a cruz também porque a cruz não pode ser dispensada do caminho de quem segue Jesus, portanto, a revitalização da comunidade que vai ter crianças, jovens, adultos, idosos, depende da reiniciação à vida cristã. Iniciar os que estão chegando e reiniciar aqueles que já estão.

Por que os desafios da Igreja, da cultura, e da educação são semelhantes na época em que vivemos?
Porque não são desafios alheios à realidade que está aí. Não são desafios só da Igreja, da educação e da família. É o nosso tempo. Nós vivemos uma época fascinante. Mas surgiram situações novas que afetaram profundamente a antropologia, a sociologia e a psicologia das pessoas, ou seja, nós não podemos ignorar que essa realidade nos desafia como um todo, não só como Igreja, mas como família, escola, sociedade. Tudo está ligado. São novos tempos e nós não podemos ter medo deles, mas enfrentá-los.

Como a religião pode se sobressair em relação ao futebol e tantos outros aspectos que tomam conta da cabeça de nossos jovens?
A questão de fundo é onde está nossa identidade. O que me faz ser quem sou. O que me dá identidade cultural, pessoal. Para muitos, o único elemento que sobrou foi o time. Não é mais a religião, nem a família, nem a cultura. Por isso que nós não podemos prescindir, jogar fora, a questão do esporte que não deixa de ser positiva. O problema é se ela é a única agregadora de sentido. O meu sentido está em um elemento muito fora de mim porque tem a questão da transcendência. Por exemplo, quando eu tiver que enfrentar dor, sofrimento, morte. Onde vou encontrar referenciais? No time? E quando eu tiver que enfrentar uma crise, onde vou buscar referenciais? Eu acho que nós precisamos ensinar caminhos de transcendência. Caminhos que ensinem esse ser humano que está muito ligado a essa terra, ao momento histórico presente, não quer saber de futuro, nega o passado. Nós temos uma história, uma meta, um projeto. Quem nega a sua história está condenado a repetir os erros do passado.

A família continua a ser importante na transmissão da fé? A comunicação é importante para a transmissão da fé, mas sem o testemunho, o padre, a falta de encontro pessoal, não continuaria ser sem sentido?
Nós precisamos garantir uma personalização de tudo. A família também está despersonalizada por causa de um trabalho exaustivo, dessa mania das pessoas falarem mais pelo celular do que presencialmente, da dificuldade de convivência e, portanto a fé também entra nesse desafio. Eu acho que é indispensável que procuremos caminhos para aproximar as pessoas para que elas dialoguem e procurem o sustento do seu cotidiano porque a nossa fé não é abstrata. Pelo contrário, ela é muito concreta. O que está faltando mesmo é uma experiência de vivência de fé.